Depois de quase cinco décadas de espera e silêncio, foi finalmente identificado o corpo do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior, desaparecido em março de 1976 durante a ditadura argentina. A notícia, divulgada neste sábado (13) pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), traz alívio à busca por respostas, mas também renova a dor de uma perda irreparável para a música e a cultura brasileiras.
Tenório, como era conhecido, acompanhava Toquinho e Vinícius de Moraes em uma turnê pela América do Sul quando saiu do hotel onde estava hospedado em Buenos Aires e nunca mais retornou. Jovem, talentoso e promissor, foi vítima de um período sombrio em que artistas, intelectuais e militantes políticos se tornaram alvos da repressão.
O trabalho da Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF) permitiu esclarecer parte desse mistério. O músico foi morto a tiros e enterrado como indigente em uma vala comum na periferia da capital argentina. A confirmação só foi possível após a comparação de impressões digitais de registros da época, num processo demorado que exigiu cooperação internacional e perseverança dos investigadores.
Tenório foi mais uma vítima da violência de Estado que marcou os anos da chamada Operação Condor, aliança repressiva entre ditaduras militares da América do Sul. O Brasil, a Argentina, o Chile, o Uruguai, a Bolívia e o Paraguai coordenaram perseguições, sequestros e assassinatos contra aqueles que ousaram pensar ou viver de forma diferente. No caso de Tenório, a vida interrompida de um artista expõe o quanto a cultura também foi alvo dessa violência.
A CEMDP afirmou que acompanha o caso de perto e mantém contato com os familiares, oferecendo apoio e buscando caminhos para que os restos mortais do pianista possam, enfim, ser resgatados e honrados. Ainda não se sabe se será possível exumar o corpo, hoje sepultado em Buenos Aires.
A confirmação da morte de Francisco Tenório Cerqueira Júnior encerra uma busca longa, mas não elimina a dor da ausência. Sua história é lembrada não apenas como a de um músico talentoso, mas como símbolo de uma geração calada pela brutalidade dos regimes militares.
O Brasil lamenta a perda, agora reconhecida oficialmente, de um de seus filhos que poderia ter contribuído ainda mais para a música e para a cultura. Mais do que nunca, sua memória se junta à de tantos outros que tiveram suas vozes silenciadas.